A TERCEIRA MEDITAÇÃO DE RENÉ DESCARTES - PARTE 6

 


                    Meditações Metafísicas

 
                                    René Descartes

 

 

Sobre a Terceira Meditação

Parágrafo 17 

Parte 6

(ii)

 

PRESSUPOSTOS E CONSEQUÊNCIAS DESSA ARGUMENTAÇÃO

 

 

Algumas livres reflexões

 

 

Segundo problema

 

Outro fato que me inquieta é a primeira certeza do método cartesiano.

 

            Acredito que é fácil provar o que realmente não existe, mas o difícil é provar como inexistente algo possível de existir.

 

            E aí está o grande dilema da filosofia e da metafísica. Porque algo que não se pode provar pela razão como existente, também é impossível de provar que não existe.

 

            Apesar da abundância do tema, fico pensando: se realmente conseguíssemos parar de pensar por alguns minutos, com o auxílio de todas as técnicas orientais e ocidentais, na busca do silêncio interior, da extrema disciplina, enfim, com todas as forças do homem, o que teríamos para dizer acerca do “cogito, ergo sum”?

 

            Será que poderíamos então, quiçá, dizer: “Sinto, logo existo”? E será que, a partir deste pensamento, eu não poderia inverter a primeira certeza, dizendo: “Existo, logo penso”?

 

            Sim, porque frente aos inúmeros relatos e experiências sobrenaturais que temos conhecimento através dos meios de comunicação e até de contatos pessoais, e também do avanço da ciência investigativa, o pensamento não tem mais aquele peso que tinha na época de Descartes. Ele passou a ser mais uma das faculdades do homem, tais como a intuição, o sentimento, a precognição, a clariaudiência, a clarividência, o sexto sentido, e tantas outras.

 

            Será que a possibilidade de ser enganado pelo pensamento não é tão real quanto com todos os outros sentidos, devido às suas próprias limitações?

 

            Enquanto Agostinho proclamava a necessidade do “crer para compreender”, parece-me que Descartes grita ao contrário, apesar de sua suposta crença no catolicismo. “Compreender para crer” soaria para Agostinho, na sua época, como a maior insensatez que um indivíduo poderia manifestar, mas apesar disto, não é o que nos suscita aqui o questionamento, e sim, o fato de que somos sabedores de que todos os sentidos podem nos enganar, assim também o pensamento, o sentimento, a intuição, e todas as outras faculdades já citadas.

 

            Agostinho, na sua obra “De Libero Arbitrio” ainda salientava, no livro II, capítulo 3, parágrafos 7, 8 e 9, que “o homem reúne em si três gêneros de ser ou três tipos de perfeição: o existir, o viver e o entender”. Os sentidos exteriores seriam distinguidos pelo sentido interior, o qual tem sua existência compreendida pela razão. Os sentidos exteriores e interiores servem à razão. A razão é capaz de perceber a si mesma e aos sentidos. Assim, é superior aos sentidos. Mas assim mesmo, a razão seria mutável e por isto mesmo, suscetível também de limitações.

 

            O homem sábio teria que conter em si os três gêneros citados. Me parece mais apropriado chamar de consciência ou autoconsciência a este ato psíquico de saber-se vivente, existente e pensante e que abrange mais do que o singular ato de pensar. Posto que, acredito, a consciência envolve, além do pensamento, o sentimento, a percepção, e quem sabe, até outros sentidos pesquisados há séculos por estudiosos das mais diversas áreas.

 

            Será que o cogito de Descartes não seria também uma mera possibilidade?

 

(continua) 

Bibliografia:

Agostinho. De Libero Arbitrio, livro II, capítulo 3, parágrafos 7, 8 e 9.

Descartes, Rene, Meditações Filosóficas (1ª, 2ª e 3ª meditação), edição Os Pensadores.

Descartes, Rene, Princípios da Filosofia, Editora UFRJ, 2002.


Nenhum comentário:

Postar um comentário